Suponha que uma autoridade, achegando-se a Dilma na parada de 7 de Setembro, quisesse puxar conversa para distrair a presidente. Suponha que a autoridade não soubesse como começar. Uma saída seria indicar com o queixo a multidão do outro lado da rua e perguntar:
— Fora isso, senhora presidente, o que está achando da festa?
Havia algo de diferente nos festejos do Dia da Independência. O desfile oficial subia a Esplanada, no sentido inverso ao da Praça dos Três Poderes. Na outra via, a ‘Marcha Contra a Corrupção’ descia rumo à praça onde estão assentados os prédios do Congresso, do STF e do Planalto.
Convocada pelas redes sociais da internet, a marcha começou tímida. Na altura da Catedral de Brasília, reunia algo como 2 mil pessoas. Aos pouquinhos, foram chegando os retardatários. Súbito, pessoas que foram ao meio-fio para assistir ao desfile oficial aderiram à passeata anticorrupção.
No final, estimou a PM de Brasília, o grupo que pedia o fim da ladroagem reunia cerca de 25 mil pessoas. Alheia à programação paralela, Dilma dividia o pedaço de palanque que lhe coube com seus familiares.
Dilma passa a mão na cabeça do neto
Separada dos manifestantes por um tapume, Dilma parecia divertir-se com o neto Gabriel, no colo da filha Paula. Gabriel e a rapaziada da marcha, eis o que havia de diferente na festa brasiliense da Independência.
Na face do neto de Dilma, a inocência de um brasileiro indefeso. Na cara dos manifestantes, a impaciência de brasileiros em busca da legítima defesa. Para alguma coisa o lero-lero higienizador de Dilma serviu. A faxina não foi feita. Mas o vaivém expôs a sujeira que os tapetes já não conseguem esconder.
Ao livrar o pescoço de Jaqueline Roriz (PMN-DF) da lâmina, a Câmara ajudou a acender o pavio. “A absolvição dela foi o estopim para essa marcha”, disse o estudante Marcos Maia, 18, um quase homônimo do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS).
Tomados pelas faixas e palavras de ordem, os manifestantes se insurgiam contra todo o melado que escorre dos podres poderes. Houve ataques ao voto secreto no Legislativo. Faixas e cartazes mencionavam a roubalheira nos ministérios. Promoveu-se a lavagem simbólica da pasta da Agricultura e do Congresso.
Apelou-se pela aplicação da Lei da ficha Limpa. Protestou-se até contra Ricardo Teixeira, o eterno presidente da Confederação Brasileira de Futebol. Em meio à multidão de jovens, algumas rugas. Alzerina Salles Pereira, 66, aposentada, foi ao asfalto vestida de preto. “Aqui no Brasil, o dinheiro sobra para poucos, enquanto muitos passam fome”, queixou-se.
Também presente, Ophir Cavalcante, o presidente da OAB, construiu uma analogia do movimento nascente com outros períodos históricos: “Essa é uma forma de dizer que país queremos, com moralidade e justiça. É um grito que precisa ser ouvido…”
“…A classe média saiu de casa e veio para a rua. Foi assim com as Diretas-Já e com o impeachment. É assim que começa.”
Difícil saber se o movimento ganhará as proporções insinuadas por Ophir. Mas num ponto o mandachuva da OAB tem razão: “É assim que começa.” Ficou demonstrado que, se quiserem, os patrícios também podem fazer da internet plataforma de lançamento para uma “Primavera Brasileira”.
Dependendo de como reagir, Dilma pode entregar ao neto Gabriel um país com menos lodo. Ou não.
F:correiopop.wordpress.com
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