Trocando em miúdos
Tudo por conta do Sofá Verde!
Geralmente os casamentos que chegam ao fim percorrem todo um caminho antes do
“adeus” que encerra a relação. Em boa parte dos casos os protagonistas deixam o
amor, se é que assim podemos dizer, morrer. Em teoria o amor nunca deveria
morrer. Por si ele deveria ser eterno, mesmo que os amantes se separassem, mas
não é bem assim que acontece…
Mesmo aqueles casais que antes trocavam juras de amor quase que pueris,
podem vir a sucumbir em algum ponto e só perceber o que aconteceu depois que
cada um foi para o seu lado. Com Pedro e Marta não foi diferente.
Após um jantar onde a sobremesa foi servida com um pedido de divórcio, Pedro
bem que tentou dormir. Mas mesmo se virando em todas as posições possíveis, não
aguentou e soltou uma pergunta seca, acordando Marta:
— Quando foi que isso começou?
— Começou o que, Pedro? — respondeu com a voz embargada pelo sono.
— Você sabe do que estou falando! Não se faça de besta! Estou falando da
gente, oras… Do que mais haveria de ser?
— Sei lá, homem! Você fala de tanta coisa que eu nem consigo mais saber do
que se trata.
— Agora até isso… Você está insinuando que eu falo demais?
Marta pensou em não responder, já estava mais do que cansada das discussões
rotineiras, mas não conseguiu. Viu que seria pior ficar com aquilo engasgado e
mesmo se permanecesse calada, sua expressão era incapaz de esconder o que
pensava.
— Insinuando? De jeito nenhum… — fez uma pequena pausa e concluiu: — Estou
afirmando, com todas as letras! Você fala mais do que o homem da cobra e a
mulher do sarampo juntos!
— Está vendo o ponto em que chegamos?
— Fala, Pedro, senhor da razão, diga aonde chegamos? — retrucou Marta, com a
paciência se esgotando.
— Não conseguimos ter uma só conversa tranquila que as agressões logo
começam. É disso que estou falando!
— Ai, meu Santo Expedito… — suspirou.
— Já começou a resmungar…
Já prevendo que aquela conversa não iria acabar tão cedo, Marta sentou-se na
cama e se serviu do copo com água que mantinha por perto. Tomou fôlego,
tentou recuperar o equilíbrio, mas a ironia continuava presente.
— Não estou resmungando, estou pedindo para ter paciência com você senão eu
não aguento. Escolhi pedir para um santo que cuida das causas impossíveis,
outro não daria conta!
— Mais ataques, não é? Depois de todos esses anos é isso que eu mereço?
— Pedro do meu coração, por favor, entenda o que vou lhe dizer… A minha
decisão de separar é por causa de atitudes como essa que você está tendo agora.
— De querer conversar? Todo casal tem que conversar! Está na regra!
— Eu sei querido, mas não às quatro da manhã! Não dava para esperar o dia
clarear? Eu tenho que acordar as seis!
— Você está falando assim comigo porque já está decidida, eu só fiquei
sabendo que você quer a separação ontem!
— Não senhor, estamos numa fase de dar dó já faz tempo, chegamos ao fim!
— Pudera… Nas minhas costas você arrumou um amante! Um não, minto, dois
amantes! Isso não é atitude de quem quer consertar o casamento…
— Cinco.
— Cinco? Cinco, o quê, Marta?
— Cinco amantes! Teve três que eu nem te contei, queria te poupar, mas agora
eu quero mais é que tudo se exploda!
O semblante de Pedro, que antes demostravam consternação, mudou. Seus olhos
pareciam que iriam pular do rosto. Mal tinha conseguido lidar com a informação
anterior, a novidade era ainda mais desoladora.
— Cinco? Enquanto eu ralava todo dia, trabalhando doze horas, você me traía
com cinco homens? É isso?
— Por algum motivo que só Deus deve conhecer, os homens acreditam que a
quantidade de horas que trabalham representa algo em um relacionamento. Eu me
sentia sozinha! O que eu podia fazer?
— Meu amor, sozinho se sente o goleiro do Madureira, que não tem sequer um
zagueiro bom para lhe fazer companhia!
— Que saco, Pedro… Lá vem você com essas analogias futebolísticas. Sabe que
não entendo “lhufas” de futebol e ainda assim insiste. Está vendo por que
chegamos nesse ponto?
— Não! Agora fiquei confuso. É por que você não entende de futebol? Se for
isso, eu te ensino.
— Não, o problema é que você insiste no erro!
— Você tem razão! Eu devia ter ouvido a minha mãe. Ela sempre me disse que
você não era a mulher certa para mim.
— Olha, Pedro, vou te falar, acho que se teve uma vez que sua mãe falou algo
certo na vida, foi essa. E logo dessa vez você não escutou… Em compensação,
todas as outras vezes em que ela só falou bobagem, você deu todo apoio. É por
isso que temos um sofá verde. Quem no mundo além da sua mãe aconselharia alguém
a comprar um sofá verde?
Com esse questionamento a discussão do casal acabou. Não havia mais
argumentos que pudessem colocar os dois na mesma sintonia. Separaram-se. Nenhum
casamento resiste a um sofá verde.
F: Marcelo Vitorino
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