A comissão parlamentar de inquérito (CPI) da Câmara dos Deputados
para investigar os negócios do empresário Carlos Augusto Ramos, o
Carlinhos Cachoeira, e que já tem apoio parlamentar necessário para ser
aberta, ainda é vista com cautela no Senado Federal. A postura de
senadores da base aliada e da oposição é aguardar a instalação dos
trabalhos do Conselho de Ética na terça-feira, dia 10.
Caberá ao
relator do conselho de um eventual processo de cassação do senador
Demóstenes Torres (sem partido-GO) - acusado de envolvimento nos
negócios ilícitos de Cachoeira -, requerer à Procuradoria-Geral da
República (PGR) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), para análise, todo o
inquérito da Polícia Federal, inclusive os anexos. Parlamentares
disseram que só a partir da análise desse material é que se terá
condição de decidir se cabe ou não a instalação de uma comissão
parlamentar de inquérito.
No início da semana, os senadores
Randolfe Rodrigues (Psol-AP) e Pedro Taques (PDT-MT) conversaram sobre a
possibilidade de iniciar logo a coleta das 27 assinaturas necessárias
para a abertura de uma CPI no Senado. Taques ponderou, no entanto, que
seria necessário aguardar o recebimento de todo o processo para ter uma
noção exata da dimensão do esquema montado por Carlos Cachoeira e o
envolvimento exato de parlamentares. Diante dessa colocação, Randolfe
Rodrigues preferiu esperar o início dos trabalhos do Conselho de Ética e
o recebimento da documentação.
"Para que possamos falar de CPI,
temos que esperar pelos autos do processo que está no Supremo Tribunal
Federal, mesmo porque esse é um esquema pluripartidário, envolve vários
partidos. Tudo vai depender do que estiver nesses autos", disse Pedro
Taques. Segundo ele, qualquer pedido de abertura de uma CPI terá que ter
um objeto de investigação bem definido para que não seja barrada pela
Secretaria-Geral da Mesa Diretora do Senado.
Pedro Taques
ressaltou que, no caso de abertura de uma comissão de inquérito, ela não
terá como foco apenas as relações de Demóstenes Torres com o empresário
de jogos ilícitos. Ao contrário, o objetivo seria uma investigação mais
ampla de todo o esquema montado por Carlos Cachoeira envolvendo
empresas e parlamentares de vários partidos.
Randolfe Rodrigues
disse que uma eventual CPI "será maior do que a simples investigação da
contravenção e da jogatina" montada por Carlos Cachoeira em Goiás e no
Distrito Federal. O senador do Psol lembrou que ele e Pedro Taques já
encaminharam um pedido à Procuradoria-Geral da República para que
enviasse ao Senado o processo da PF que hoje está no Supremo Tribunal
Federal, o que não foi feito até o momento. Já um pedido do Conselho de
Ética, acrescentou, tanto ao Supremo quanto a Procuradoria teriam que
acatar.
O líder do PT, senador Walter Pinheiro (BA), concorda com
essas ponderações. Segundo ele, havendo consistência no material que
será encaminhado ao conselho, ele não vê motivos para que o Senado não
abra uma comissão parlamentar de inquérito para investigar os negócios
de Carlos Cachoeira e os envolvidos em um esquema de corrupção. "Aberta
uma CPI, ela não pode ficar restrita ao Demóstenes Torres. É muito
pouco. Temos que analisar todo o esquema montado e a participação dos
outros", ressaltou o petista.
Feita a análise de toda a
documentação, e se houver fatos consistentes que justifiquem a abertura
da comissão de inquérito, pelo Senado, o líder do PT destacou que a
investigação tem que ser "rigorosa". A seu ver, qualquer decisão neste
sentido só poderá ser tomada a partir do dia 17 de abril, uma vez que
instalado os trabalhos do Conselho de Ética e requerida a documentação
que está no STF, o mais provável é que o processo chegue para os
senadores a partir da quinta-feira, dia 12.
Já o líder do PSDB,
senador Alvaro Dias (PR), culpa o Executivo de ingerência para que não
haja qualquer abertura de CPI seja pela Câmara ou pelo Senado. Ele
também acusa a Polícia Federal e a Procuradoria de realizarem um
"vazamento seletivo" das informações contidas no processo. "Houve uma
orientação política nesses vazamentos, explícita para esconder outros
nomes".
Alvaro Dias disse que não há qualquer possibilidade da
oposição deixar de apoiar uma eventual abertura de CPI para investigar
os negócios e as pessoas envolvidas no esquema comandado por Carlos
Augusto Ramos. Entretanto, ele ressaltou que qualquer apoio da oposição
dependerá, também, dos partidos da base aliada apoiarem uma CPI para
investigar denúncias de desvios de dinheiro público praticadas em várias
áreas do governo, principalmente na área da saúde. "Seria uma CPI da
Corrupção".
Demóstenes e Carlinhos Cachoeira
Em 6 de
março de 2012, o senador Demóstenes Torres (GO) subiu à tribuna para dar
explicações sobre as denúncias de sua proximidade com o bicheiro Carlos
Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, descoberta pela operação Monte
Carlo, da Polícia Federal, que terminou em fevereiro, com a prisão de
Cachoeira e de outras 34 pessoas. Demóstenes disse que a violação do seu
sigilo telefônico não havia obedecido critérios legais. Dez dias
depois, o jornal Folha de S.Paulo publicava um relatório do
Ministério Público Federal (MPF) que indicava que o grupo comandado por
Cachoeira entregou telefones antigrampos para políticos, entre eles
Demóstenes, que admitiu ter recebido o aparelho.
O jornal O Globo noticiou,
em 23 de março, gravações da PF que flagraram Demóstenes pedindo para
Cachoeira lhe pagar R$ 3 mil em despesas com táxi-aéreo e vazando
informações sobre reuniões reservadas que manteve com representantes dos
três Poderes. Em 27 de março, Demóstenes pediu afastamento da liderança
do DEM no Senado para "acompanhar a evolução dos fatos". No dia
seguinte, o Psol entrou com representação contra o parlamentar no
Conselho de Ética do Senado e, um dia depois, em 29 de março, o ministro
do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandovski autorizou a
quebra do sigilo bancário de Demóstenes, solicitando ainda um
levantamento sobre as emendas e os projetos relatados por ele para saber
se Cachoeira, acusado de controlar a máfia dos caça-níqueis e de
corromper policiais e políticos em Goiás, foi beneficiado.
Nas
gravações, Demóstenes também aparece acertando um suposto lobby pela
legalização dos jogos de azar no Congresso em 2009. Em outra conversa,
Cachoeira pede ajuda no processo de um delegado e três policiais de
Anápolis (GO) acusados de tortura e extorsão. Os dois ainda conversaram
sobre um "negócio" milionário na Infraero. Na ocasião, Demóstenes teria
se valido da relatoria da CPI do Apagão Aéreo para levantar informações e
sondar contratos de informática na estatal.
O presidente do DEM,
senador José Agripino Maia (RN), anunciou em 2 de abril que o partido
decidiu abrir um processo que poderia resultar na expulsão de
Demóstenes, que, no dia seguinte, pediu a desfiliação da legenda.
F: Ag Brasil
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